24 fevereiro 2015

Renamo: desobediência civil como estratégia política (14)

Décimo quarto número da série. Termino o ponto 5 do sumário proposto aqui, a saber: 5. Dilemas políticos da PGR e do Estado. E, assim fazendo, termino esta série. A Renamo em geral e o seu presidente em particular são, efectivamente, resistentes: resistem a tudo o que não venha da sua lavra. Resistem, especialmente, à Constituição. Os discursos de Dhlakama são, permanentemente, um questionamento da Constituição. O mais recente exercício de cesarismo à Dhlakama consistiu e consiste em defender publicamente que a Assembleia da República é obrigada a aprovar o anteprojecto que a Renamo deverá apresentar no próximo mês sobre o "governo das regiões autónomas". Caso o não faça, o povo impedirá o Presidente da República de governar - promete Dhlakama em tom violento (aqui e aqui). Esta impugnação cesarista da Constituição, do parlamento e, especialmente, da esfera de actuação do Presidente da República, é, no mínimo, grave. Seguro da força política mediática que ganhou nos últimos meses, autometamorfoseado em vítima injustiçada pela história, autoproclamado herói, o presidente da Renamo parece ter bloqueado por completo a actuação da Procuradoria-Geral da República, ao mesmo tempo que colhe os aplausos entusiásticos de uma parte da intelectualidade local. Estado em geral e PGR em particular estão politicamente manietados, sopesando o risco de uma nova guerra (Dhlakama sabe bem disso e deve sorrir muito com isso) e as preocupações do grande Capital internacional, não estranhando, assim, que a Renamo e Dhlakama possam dizer o que bem lhes aprouver sem que haja impugnação criminal estatal, usando a desobediência civil como estratégia política e a sistemática ameaça de jaquerie por parte de um suposto e fiel povo-escudo dos comícios. E por essa forma se deita, sobranceiramente, no caixote do lixo da história, as tenebrosas recordações de um passado referido e analisado aquiaquiaquiaquiaquiaquiaquiaqui e aqui.
Adenda 1: Do cesarismo de Dhlakama: "O líder do partido Renamo deixa claro que “não há guerra” mas não vai tolerar provocações. “Quero deixar claro aos comunistas da Frelimo se tentarem provocar a Renamo, tentarem disparar para a Renamo, juro pela alma da minha mãe que a resposta não será aqui no norte (...) agora é aquecer lá, nos prédios lá, lá em Maputo onde estão os chefes”. Aqui.
Adenda 2: segundo o "Verdade/Facebook", Dhlakama autoproclamou-se herói. Aqui.
Adenda 3: um muito recente texto do historiador Michel Cahen, em francês, aqui.
Adenda 4: de uma crónica de Sérgio Vieira: "A ideia da divisão e fragmentação da nossa terra iniciou-se com Banda. Em Julho de 1964, na Cimeira do Cairo, ele propôs a Nyerere e a Nasser a entrega da zona centro de Moçambique a Malawi, garantindo então a reconstrução do Império Marave e o acesso ao mar. Ambos chefes de Estado, polidamente, o mandaram passear. Nkavandame e Simango com Gwenjere retomam a ideia em 1968, rechaçada pelo II Congresso. Jorge Jardim volta com a ideia da divisão do nosso país em 1973. Cristina, fundadora da Renamo com o apoio da Rodésia e do “apartheid”, tentaram fazer vingar a velha ideia. Falharam." Aqui.

2 comentários:

nachingweya disse...

Não fosse o 25 de Abril a independência de Moçambique seria um facto anticonstitucional à luz das leis de Portugal. As constituições devem ser adequadas aos supremos interesses dos povos e não ser instrumentos de execução de planos de grupos, sejam eles associações, partidos ou seitas.
Talvez fosse preciso passarmos pela divisão do país para aprendermos a valorizar e respeitar a necessidade de equidade na redistribuição dos ganhos da unicidade nacional. A autonomização regional mais não do que a descentralização do poder que em teoria muito se arrota.

Foquiço disse...

Bom dia Sr. Professor!

O maior opositor do Governo é a má governação. COnseguiu-se vencer a difícil tarefa de construção da nação moçambicana, vencendo os seus microcosmos. Com essa victória, só nos resta adicionar a boa governação para garantir o funcionamento saudável da estrutura (Estado)... isto passa necessariamente em não violentar as instituições em voga, porém, é dever fazer os devidos (passe a redundância) arranjos institucionais que melhor efectivem a prossecução da felicidade da nação moçambicana (PS: não para acomodar, sim para dar solução). A melhor forma de resolver um conflito é evitá-lo. Não sendo possível evitá-lo, melhor é não deixá-lo propagar-se.

Todos somos responsáveis, pois, não vamos dizer que a culpa é apenas do polícia que ou exigiu ou recebeu dinheiro do chapeiro, este tem também a sua cota-parte, mais ainda, torna-se em fonte para o aparecimento de mais polícias iguais.

Mais não disse.

Obrigado!