17 janeiro 2020

Um grande problema

Um grande problema é que aprendemos a usar as palavras como se tivessem vida por elas-mesmas. Quer dizer, aprendemos que o bom e o mau existem em si-mesmos, aprendemos que há coisas boas e coisas más independentes das relações sociais, da conflitualidade dessas relações e da produção de pontos de vista e de etiquetas que, surgindo no interior da conflitualidade política, tornam-se dominantes e legítimos.

16 janeiro 2020

Poder político em dias de festa

Cerimónias propiciatórias oficiadas pelos curandeiros em memória dos espíritos, coros de pendor religioso e espectáculos musicais são alguns dos ingredientes usados na produção simbólica e massiva de poder político em dias de festa.

15 janeiro 2020

Fazer a história

Um dia Karl Marx escreveu que se as pessoas fazem a história, não são porém livres de a fazer arbitrariamente, nas condições por elas escolhidas, mas nas condições herdadas do passado.

14 janeiro 2020

Hipótese

Hipótese: quanto mais gravosas forem as condições de vida, mais ampla será a vida informal e mais diversificado e profundo o recurso a esquemas de sobrevivência numa sociedade profundamente marcada pela fractura social.

13 janeiro 2020

Uma coluna semanal

"Fungulamaso" (=abre o olho, está atento, expressão em ShiNhúnguè por mim agrupada a partir das palavras "fungula" e "maso") é uma coluna semanal do "Savana" sempre na página 19 com 148 palavras. Edição 1357 de 10/01/2020. Se quiser ampliar a imagem, clique sobre ela com o lado esquerdo do rato.

12 janeiro 2020

Biografia e androcentrismo

Biografia e androcentrismo são êmbolos da história comezinha e dos sistemas de conhecimento imediato, a primeira eclipsando a visão dos sistemas sociais, o segundo eclipsando o papel jogado pelas mulheres.

11 janeiro 2020

Uma coluna de ironia

Na última página do semanário "Savana" existe uma coluna de ironia - suave nuns casos, cáustica noutros - que se chama "À hora do fecho". Naturalmente que é necessário conhecer um pouco a alma da vida local para se saber que situações e pessoas são descritas. Segue-se um extracto reproduzido da edição 1357, de 10/01/2020.
Nota: o acesso ao Savana digital tornou-se um exclusivo dos assinantes razão por que deixei de colocar a edição completa aqui e na crónica semanal que divulgo à segunda-feira.

10 janeiro 2020

Sociólogos

Ao perfil do sociólogo "vivisseccionista" (aquele que disseca o corpo social para o compreender) irmana-se o perfil do sociólogo reformador (aquele que luta por uma sociedade diferente). O primeiro trabalha no reino do "isto é assim"; o segundo enxerta nisso o reino do "isto deve ser assim".

09 janeiro 2020

Pés

O pé só é sociológico se inscrito num sapato. E os sapatos variam, os sapatos dos presidentes dos conselhos de administração do país não são os sapatos e os chinelos do Xiquelene, os sapatos das deputadas não são os sapatos das mamanas do Xipamanine ou os chinelos das camponesas do Zóbuè.

08 janeiro 2020

Insegurança social

Há efectivamente um mal-estar na civilização, para resgatar o título de um famoso livro de Freud. Esta é, certamente, a era da insegurança social total, ampliada pela rapidez permitida pelas novas técnicas de informação e comunicação. Era de insegurança social total que tem no terrorismo uma das suas alavancas. Em nome de um deus, de um credo, de uma cartilha e, não poucas vezes, de uma nação, organizações terroristas que se multiplicam liquidamente pelo mundo assassinam o futuro e as suas sementes, as crianças, transformando medo e morte em cultura normalizada. A liberdade, a democracia, o direito à vida sem medo e a busca de um futuro mais digno estão verdadeiramente em perigo neste mundo de senhores da guerra e de risco sem fronteiras. Leia aqui.

07 janeiro 2020

Para a psicologia dos rumores em Moçambique [151]

-Lenda urbana, boato ou rumor é "um relato anónimo, breve, com múltiplas variantes, de conteúdo surpreendente, contado como verdadeiro e recente num meio social do qual exprime de maneira simbólica os medos e as aspirações." (in Renard, Jean-Bruno, Rumeurs et légendes urbaines. Paris: PUF, 2006, 3.e éd., p.6).
Número inaugural da série aqui. Número anterior aqui.
Prossigo com a oitava e última história dos rumores, desta vez sobre a cólera.
Doença provocada por uma bactéria, a cólera gera grande inquietação nas comunidades afectadas. Em vários períodos da história da humanidade, em vários países - o nosso incluído, como mostrou o exemplo de Malema -, ela tem dado e continua a dar origem a reacções que podem desembocar na cólera social - com resultados não poucas vezes trágicos -, com pessoas interrogando-se angustiadas e procurando encontrar os responsáveis de tão aflitiva perda de fluidos. Regra geral, em períodos históricos diferentes,  a pergunta feita não era nem é "O que provoca isto?, mas "Quem provoca isto?".
Nota: os rumores que tenho apresentado não seguem uma ordem cronológica.

06 janeiro 2020

Uma coluna semanal

"Fungulamaso" (=abre o olho, está atento, expressão em ShiNhúnguè por mim agrupada a partir das palavras "fungula" e "maso") é uma coluna semanal do "Savana" sempre na página 19 com 148 palavras. Edição 1356 de 03/01/2020. Se quiser ampliar a imagem, clique sobre ela com o lado esquerdo do rato.

05 janeiro 2020

PIR simbólica

No mundo de causalidade, diagnóstico e terapia a cargo dos milhares de curandeiros existentes no país, os problemas sociais são sempre considerados produto da bondade ou da malignidade dos espíritos ou da magia à distância de alguém perverso. No fundo estamos perante uma espécie de Polícia de Intervenção Rápida simbólica, sempre no terreno, cujas características nos são inculcadas na infância e cuja acção importa prevenir ou remediar em permanência através de múltiplos cuidados ao longo da vida.

04 janeiro 2020

Uma coluna de ironia

Na última página do semanário "Savana" existe uma coluna de ironia - suave nuns casos, cáustica noutros - que se chama "À hora do fecho". Naturalmente que é necessário conhecer um pouco a alma da vida local para se saber que situações e pessoas são descritas. Segue-se um extracto reproduzido da edição 1356, de 03/01/2020.
Nota: o acesso ao Savana digital tornou-se um exclusivo dos assinantes razão por que deixei de colocar a edição completa aqui e na crónica semanal que divulgo à segunda-feira.

02 janeiro 2020

Hoje em Guimarães/Portugal






Para a psicologia dos rumores em Moçambique [150]

-Lenda urbana, boato ou rumor é "um relato anónimo, breve, com múltiplas variantes, de conteúdo surpreendente, contado como verdadeiro e recente num meio social do qual exprime de maneira simbólica os medos e as aspirações." (in Renard, Jean-Bruno, Rumeurs et légendes urbaines. Paris: PUF, 2006, 3.e éd., p.6).
Número inaugural da série aqui. Número anterior aqui.
Inicio hoje a oitava e última história dos rumores, desta vez sobre a cólera, com o seguinte exemplo introdutório:
Em Malema, província de Nampula, surgiu em Outubro de 2015 o rumor de que a cólera estava a ser introduzida pelas autoridades locais. Houve tumultos e confrontos entre manifestantes e polícia [“Diário de Moçambique”, edição de 27/10/2015].
Nota: os rumores que estou a apresentar não seguem uma ordem cronológica.

01 janeiro 2020

Votos

Que os deuses e os espíritos vos protejam em 2020 e habitem sem pausa o vosso futuro em tudo o que mereceis de bom.

Nenhum tijolo

Cada um de nós apenas se pode isolar socialmente. Mesmo quando julgamos estar isolados, continuamos totalmente mergulhados na sociedade da qual julgamos ter-nos afastado. Todas as nossas referências, tudo o que manipulamos, tudo o que somos, pertence a essa sociedade. Nenhum tijolo de uma casa se compreende fora da constituição da casa.

31 dezembro 2019

Striptease

A matriz que organiza o corpo em função de um certo tipo de nudez e segrega a sexualidade de mercado tem no striptease a sua coluna vertebral. O striptease permite dois movimentos de erotismo: a sexualização no primeiro movimento, a dessexualização no segundo movimento.
Ambos são totalmente criação androcêntrica. O primeiro movimento é constituído pelo conjunto de signos destinados a despertar o público para a nudez feminina, de par com a música e com os movimentos eróticos da mulher. O início do desnudamento do corpo da mulher é a antecâmara do sexualismo de circo produzido pelo homem. O cabaret, antónimo do lar, é o veículo subversor do conjunto que é a mulher, em favor unicamente da sua sexualidade - como diria Roland Barthes, da "nudez como vestuário natural da mulher" .
O segundo movimento completa e inutiliza o primeiro pelo excesso, pela ênfase. O ritual do strip-tease acaba, afinal, por "dessexualizar a mulher no próprio momento em que é despida", para usar, de novo, uma imagem de Roland Barthes. Cenário, acessórios e estereótipos mostram a nudez para melhor a fazerem esquecer, confinando-a ao mundo do espectáculo.

30 dezembro 2019

Uma coluna semanal

"Fungulamaso" (=abre o olho, está atento, expressão em ShiNhúnguè por mim agrupada a partir das palavras "fungula" e "maso") é uma coluna semanal do "Savana" sempre na página 19 com 148 palavras. Edição 1355 de 27/12/2019. Se quiser ampliar a imagem, clique sobre ela com o lado esquerdo do rato.

29 dezembro 2019

Processo

Tudo está em processo, em permanente construção e reconstrução na mobilidade urbana, em todas as suas ramificações capilares e andróginas. Não se está já na tradição, mas não se chegou ainda à modernidade. O está-se a ser, o entre-dois, são a regra. Constrói-se desconstruindo, inventa-se reinventando, destrói-se mantendo, vai-se regressando, caminha-se para atrás porque se vai para a frente. Tudo é canibalizado num movimento browniano, contraditorial.

28 dezembro 2019

Uma coluna de ironia

Na última página do semanário "Savana" existe uma coluna de ironia - suave nuns casos, cáustica noutros - que se chama "À hora do fecho". Naturalmente que é necessário conhecer um pouco a alma da vida local para se saber que situações e pessoas são descritas. Segue-se um extracto reproduzido da edição 1355, de 27/12/2019.
Nota: o acesso ao Savana digital tornou-se um exclusivo dos assinantes razão por que deixei de colocar a edição completa aqui e na crónica semanal que divulgo à segunda-feira.

27 dezembro 2019

Para a psicologia dos rumores em Moçambique [149]

-Lenda urbana, boato ou rumor é "um relato anónimo, breve, com múltiplas variantes, de conteúdo surpreendente, contado como verdadeiro e recente num meio social do qual exprime de maneira simbólica os medos e as aspirações." (in Renard, Jean-Bruno, Rumeurs et légendes urbaines. Paris: PUF, 2006, 3.e éd., p.6).
Número inaugural da série aqui. Número anterior aqui.
Vou finalizar a história do rumor da prisão da chuva no céu - sétima desta série -, da seguinte maneira:
O problema de compreensão torna-se dramático quando histórias falsas no seu sentido real são sentidas como verdadeiras no seu sentido figurado. Ou, dito de outra maneira, quando histórias objectivamente falsas são, porém, sentidas como subjectivamente verdadeiras. É como se estivéssemos confrontados com uma metalinguagem do vivido social cujas regras nos escapassem.
Nota: os rumores que estou a apresentar não seguem uma ordem cronológica.

26 dezembro 2019

Racismo biológico

Racismo biológico é um conjunto de representações sociais que atribui valor positivo ou negativo a características físicas normalmente consideradas hereditárias. Este tipo de racismo - digamos que é o racismo por excelência, o racismo fundador - tem sido usado na história para justificar a opressão social e, no seu clímax, o genocídio, estando intimamente associado à luta pelo monopólio de recursos de vida e poder.

25 dezembro 2019

Votos

Feliz Dia da Família para cada uma e cada um de vós.

Generalização

A generalização é um dos mais fascinantes campos da cognição humana. A partir de traços, de atributos, de características de alguns indivíduos de um determinado grupo, criamos totalidades, unidades identitárias, sem que tivéssemos podido verificar se todos os indivíduos do grupo possuem esses traços, esses atributos ou essas características. Mas, felizes, dizemos: eis a verdade.

24 dezembro 2019

Dois tipos de consciência

Podemos considerar dois tipos de consciência: a imediata, digamos que instintiva, dos actores sociais que conhecem o papel que jogam ou que julgam jogar na trama da vida; e a consciência social, consciência de profundidade, consciência panorâmica e telescópica reportada ao conjunto dos eixos mais profundos pelos quais as sociedades (e não os indivíduos em si) são produzidas e reproduzidas (este é um nível mais elevado, mas nem sempre a consciência social é - para usar um paradoxo - consciente).

23 dezembro 2019

Uma coluna semanal

"Fungulamaso" (=abre o olho, está atento, expressão em ShiNhúnguè por mim agrupada a partir das palavras "fungula" e "maso") é uma coluna semanal do "Savana" sempre na página 19 com 148 palavras. Edição 1354 de 20/12/2019. Se quiser ampliar a imagem, clique sobre ela com o lado esquerdo do rato.